Como reduzir a inadimplência da clínica veterinária
Por Dr. Leandro Zaine, CRMV-SP 21.418, fundador da Vet Up
Muitas clínicas passam por o sério problema de vender um produto ou prestar um serviço e não receber do cliente. Poderíamos dividir isso em duas categorias. O “fiado” que é aquele famoso “depois eu passo para acertar” e o calote “não tenho dinheiro para pagar”. Talvez a primeira situação seja mais comum, mas ambas são bastante prejudiciais. Não ser pago ou demorar para receber pode comprometer seriamente o funcionamento dos nossos negócios.
Vejo isso como um problema grave na gestão do negócio (falaremos sobre as causas mais adiante). Essa falha administrativa poderíamos separar em 3 categorias:
1) Financeiro – não há bons controles financeiros e não se acompanhe de perto os índices de inadimplência e o efeito disso no fluxo de caixa.
2) Atendimento – um cliente bem atendido e bem conscientizado do valor do serviço tende a reclamar menos de preço e formas de pagamento.
3) Treinamento da equipe – a falta de organização interna e processos claros que todos da equipe sigam, também é causa de falha nos recebimentos. O cliente acaba encontrando brechas na política de pagamento frágil e se aproveita disso.
Para exemplificar o problema de falhar nesses 3 quesitos, trago um caso de um cliente meu que é a prova viva das consequências da inadimplência. Avaliamos os resultados de um ano de trabalho de uma clínica que vendia, em média, R$90.000,00 por mês. Ao final desse período, mais de R$100.000,00 estavam em aberto! Ou seja, é como se um mês do ano eles tivessem trabalhados de graça.
Para piorar, em um dos meses, as vendas não recebidas chegaram a quase R$45.000,00, ou 50% do faturamento mensal. Quando vimos isso, acendeu um grave sinal de alerta e passamos a adotar medidas mais drásticas para combater a inadimplência e impedir que a empresa quebrasse nos meses seguintes. Estas medidas trago aqui neste texto.
CONSEQUÊNCIAS DA INADIMPLÊNCIA
As consequências dessa falta de pagamento se devem ao fluxo de caixa negativo. Ou seja, há um desbalanço entre as entradas e saídas de dinheiro da sua empresa, o que pode acarretar problemas mais sérios. Ao fazermos uma venda, temos sempre um gasto envolvido, mesmo quando é a prestação de serviços, pois envolve insumos para isso. Se for um produto vendido (ração, acessório, medicamento), pior ainda, pois esse custo direto é maior ainda. O problema então se torna maior, pois além de deixarmos de receber, nós tivemos um gasto com aquela venda, o que acarreta um saldo negativo.
Para aquele cliente que “demora, mas paga”, temos que lembrar que os nossos fornecedores não nos dão tanto prazo igual nós acabamos por dar aos clientes. Então, isso significa que precisaremos deixar uma parte das nossas reservas “empatadas” até recebermos do cliente.
Tudo isso acarreta menos dinheiro disponível à empresa, que em um momento pode faltar para pagar nossos funcionários, investir em equipamentos ou até mesmo, corroer nosso lucro líquido. Outra consequência é que acabamos trabalhando a mais para ter uma remuneração adequada e acabamos não vendo dinheiro no bolso.
CAUSAS DA INADIMPLÊNCIA
Alguns podem argumentar que esse é um aspecto cultural da cidade dizendo “aqui na minha cidade as pessoas são assim, ninguém paga na hora”. A realidade bem clara é que seus clientes estão mal-acostumados! No nosso trabalho de consultoria em clínicas veterinárias, atendemos várias clínicas de cidades pequenas e percebemos que o problema maior está na forma do dono pensar. Quando conseguimos trabalhar isso, as coisas mudam, como veremos com as dicas a seguir.
Outra causa para a inadimplência que podemos apontar é o perfil de cliente errado. Uma fórmula certa para termos dificuldades no nosso negócio é querermos atender todo mundo. Se o nosso foco é na qualidade, precisamos buscar o perfil de cliente que se preocupa com isso. Pessoas que buscam sempre “descontos” e não conseguem valorizar um serviço de qualidade terão mais dificuldade na hora de aceitar o valor da conta. O ideal, então, seria trabalhar com clientes alinhados a essa proposta de valor. A única restrição disso são hospitais 24 horas e atendimentos de plantão, nos quais acabam aparecendo clientes com os perfis mais diversos.
Uma última causa que aponto são os aspectos econômicos da cidade (detalhe: por uma coincidência infeliz, escrevo esse texto bem no meio à crise do Coronavírus que tem fechado muitas empresas e o faturamento tem despencado). Se a cidade “está quebrada”, aí, realmente é de se entender a dificuldade de o cliente pagar a conta. A sugestão então é algo mais administrativo. Enxugue o máximo possível de custos até a situação se reestabelecer e acompanhe a economia local para perceber essa evolução. Outra recomendação é que você sempre tenha reservas de capital e bons controles financeiros para se preparar para tempos de escassez.
POSSÍVEIS SOLUÇÕES
Como o veterinário gestor pode lidar com esse grave problema, então? A seguir está uma série de dicas:
1) MEÇA PRECISAMENTE OS NÍVEIS DE INADIMPLÊNCIA – Para se implantar um tratamento adequado, precisamos de um bom diagnóstico. Esses números devem ser fáceis de se obter e, para isso, o uso de um bom sistema pode ser importante (esse controle em Excel ou cadernos é coisa do século passado). Isso vai permitir você definir um limite aceitável e trabalhar para atingir essa meta (recomendamos que seja, no máximo, 5% das vendas). Esses dados devem ser olhados, no mínimo, semanalmente (o ideal seria diariamente para quem esse problema é mais grave).
2) TENHA AS REGRAS DA EMPRESA POR ESCRITO (e de forma empática) – Para todo cliente novo é importante que você entregue um informativo contendo: formas de pagamento, prazos, número de parcelas, valor por parcela etc. Muitas empresas têm regras muito subjetivas e cada um da equipe cobra de uma maneira. Isso nunca pode acontecer, pois deixo o cliente confuso (e folgado). Todos têm que seguir a mesma regra e comunicar isso ao cliente claramente e de uma forma empática. Aquela mensagem mal-educada encontrada em muitos estabelecimentos não pode ser tolerada: “não fazemos fiado, a crise é de todos”. Esse é um tipo de comunicação que demonstra que a empresa está “de saco cheio” dos clientes.
3) NA ADMISSÃO, PERGUNTE A FORMA DE PAGAMENTO – Para evitar o famoso “não sabia que tinha que pagar”, ao cadastrar o cliente no seu sistema pergunte a forma de pagamento e registro. Isso ajudará a mostrar ao cliente que o serviço tem custos envolvidos.
4) PEÇA AUTORIZAÇÃO PARA OS DÉBITOS – Na consulta, vamos falando de produtos, procedimentos e exames e o cliente não está entendendo nada. Quando chega para pagar a conta ele diz, “mas o doutor não falou disso”. Então, o cliente precisa ter bem claro o que está comprando e quanto custa. Um procedimento fundamental da recepção nesse quesito é imprimir a conta, explicar para o cliente cada item e valor e entregar esse papel para ele levar.
5) SOLICITE PAGAMENTOS ADIANTADOS – Não me agrada muito fazer isso para consultas (por mais que os médicos o façam e já estamos acostumados), mas, para cirurgias e internações, especialmente quando há risco de morte (“morreu, não preciso pagar, doutor”) parece ser uma boa prática para diminuir os calotes. Para os internados, renove o pagamento, no máximo, a cada 48 horas, para não deixar contas muitos altas se acumularem.
6) INSISTA NO PAGAMENTO – Se o cliente ofereceu certa resistência a pagar, primeiramente insista que o valor precisa ser pago no dia. A nossa experiência mostra que mesmo para aquele cliente que diz “não ter condição nenhuma” sempre aparece um cartão de um parente, vizinho etc. Como eu costumo dizer: “o bolso do cliente é sempre mais elástico que ele nos relata”. Insista nisso e você aumentará seus recebimentos (obs.: nunca prenda a pessoa ou animal dentro da empresa se ela não pagar, não podemos fazer isso, é cárcere privado).
7) FACILITE O PAGAMENTO – É melhor parcelar em mais vezes do que você poderia do que não receber, então use o parcelamento maior como uma ferramenta. Dica: nunca ofereça de cara o parcelamento máximo que você pode fazer. Se é em 4 parcelas, ofereça 3. Se o cliente relutar, só então ofereça a quarta parcela. Podemos pensar também em um parcelamento maior (10 a 12 vezes) com juros para o cliente (muitos aceitam). Outra saída é oferecer descontos consideráveis para pagamento em dinheiro (até 10%).
8) RESTRINJA O CRÉDITO – Para isso, podemos negar novas vendas aos clientes inadimplentes (é uma das ações que mais produz resultado). Ou seja, a compra dele está bloqueada até que ele acerte o valor pendente. Ao implantar esta prática já ouvi vários relatos sobre o que aconteceu: a) perdemos de vez aqueles clientes “aproveitadores” e achamos ótimo; b) o cliente “mal-acostumado” achou ruim inicialmente, mas recebemos contas pendentes há muito tempo e ele continuou sendo cliente. Só tenha atenção ao código de ética, pelo qual somos obrigados a atender emergências ou quando formos o único profissional da área na cidade. Vale também consultar o CPF do cliente nos órgãos de proteção ao crédito.
9) SE O CLIENTE NÃO PAGAR, TENHO O DOCUMENTO ASSINADO DE AUTORIZAÇÃO DE DÉBITO – É muito importante termos um documento assinado que ele autorizou o débito. Ainda sem falar em cobrança judicial e na esperança de receber logo, vale mais uma dica, pergunte a ele a data de provável pagamento e entre em contato na data informada. Uma ação que foi colocada em prática em um Hospital Veterinário que reduziu a inadimplência foi cobrar na própria semana da venda. Eles perceberam que quanto maior o intervalo entre a data da venda e a data de cobrança, menor a chance de receber.
10) TIRE A DISCUSSÃO FINANCEIRA DO VETERINÁRIO – Se nós somos o dono do negócio e atendemos o cliente, ele não pode perceber que temos o poder de flexibilizar as regras, senão se aproveitará disso. Quando possível, não discuta valores com o cliente e transfira essa responsabilidade à recepção. Os efeitos disso são bastante positivos para todos que implantaram. Alguns chegam a despistar o cliente dizendo que tem um sócio ou consultor que faz o financeiro e que essas decisões passam por ele. Isso sempre funciona bem.
Como conclusão, deixo essa frase: “você anda tão ocupado que não tem tempo para ganhar dinheiro”. A inadimplência é consequência direta disso. Dica: tenha um horário fixo para fazer o administrativo da sua empresa e veja seus resultados melhorarem.
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